
Ainda que eu quisesse acreditar, quisesse mesmo, ressalto, ainda assim, o presságio de novas mudanças não me parecia real. As palavras que eu havia dito ao estranho voltavam para mim como se quisessem me lembrar, me mostrar um caminho que eu não entendia. A cena no trem agora me parecia vaga, turva, como se algo em mim não quisesse seguir adiante, não deixasse eu ver tudo aquilo que havia para ver. Mas mesmo assim as palavras voltavam, me mantinham desperta. Como se fossem um sinal, talvez tentando me alertar para tudo que estava por vir, tudo que poderia ser, acontecer, fazer, se eu simplesmente me mantivesse com os olhos abertos.
Deixei um leve suspiro escapar de meus lábios enquanto eu contemplava minha imagem no espelho. Eu podia notar Max impaciente atrás de mim, ainda que estivéssemos longe de nos atrasar. “Talvez eu devesse ter adiado minha vinda um pouco mais” Uma grande parte do fato de Max ter vindo para Volterra antes de mim, é que, tolamente, eu havia acreditado que esses tipos de jantares teriam se esgotado no primeiro mês. Tolamente.
Observei-o pelo espelho, como se eu o estivesse vendo através de um quadro, Maximilliam não havia mudado muito desde que nos conhecemos, ainda tinha os mesmos traços pelos quais eu havia me apaixonado perdidamente, mas, de certa forma, algo faltava agora. Era como se uma outra pessoa tivesse tomado o seu lugar, os sorrisos agora eram raros e comedidos, suas ações controladas. Faltava espontaneidade, sobrava autocontrole.
Seu olhar cruzou com o meu através do espelho, e por uns míseros segundos eu quase pude ver o meu antigo Max ali, sendo substituído logo em seguida por esse Max frio e seguro de si. “Por que, Max?” Eu tinha vontade de perguntar, tinha vontade de me agarrar a ele, fazê-lo ver, me olhar, mas eu sabia que de nada adiantaria, essa era uma luta perdida. Eu o vi se aproximar por trás de mim, segurando nos meus ombros, - Pronta, Evie? – Seu olhar encarava o meu, mas não havia nada para se ver ali. Assenti, e deixei que ele me encaminhasse.
“Eu não pertenço a isso. Não quero pertencer. Não quero palavras comedidas, frases decoradas e sorrisos frouxos.” Um pequeno sorriso se formou no meu rosto ao lembrar de Fábia “Evanna, essa gente recebe um tapa na cara com um sorriso nos lábios! E agradecem, ainda por cima. Como podem?!” “Não sei, Fab. Não sei, não é o meu mundo, não quero entender. Eu não quero entender.”
Fomos recepcionados por Margareth, sua animação seria quase contagiante, se seu sorriso não fosse tão forçado, “Mas Evie, será fácil você se adaptar a eles, lembra de Madagascar?! Sorria e acene. Sorria e acene” Um sorriso sincero se apossou dos meus lábios, e eu aproveitei para direciona-lo à Margareth, e pude sentir a aprovação de Max ao meu lado.
Sendo deixada “aos cuidados” de Margareth, como se fosse uma criança pequena, observei Max se reunir com Brian, não sem antes este me cumprimentar ”amavelmente”. Enquanto Margareth me direcionava para a mesa, deixei meus pensamentos soltos, vagando por entre aqueles estranhos. “Você me disse, Jeff, que somos únicos, mas estou cercada por pessoas iguais, comedidas, sem vida. Seus gestos parecem ensaiados, como se tivessem ido à mesma escola, aprendido a chegar exatamente tantos minutos antes do jantar, falar exatamente as mesmas palavras, ter aquele tipo de reação diante de um assunto... Estou cercada por eles, todos iguais, e me sinto sufocada. Presa representando um papel que não me pertence.”
Assenti para Margareth, com um leve curvar de lábios, mesmo que eu não soubesse o que ela havia comentado, mas o fato de eu encontrar um pouco de emoção naqueles olhos, ainda que fossem de reprovação, me fez instintivamente segui-los até o ponto em que estavam fixos.
Meu olhar cruzou com o dele, e eu quase pude me sentir cair dentro daqueles olhos, dentro do brilho que havia ali de todas as emoções que ele já sentira. Eu queria poder me perder dentro daquelas emoções, como se assim pudesse tê-las em meus olhos também, mas sustentei o olhar apenas o permitido pela “etiqueta” e assenti em cumprimento.
“Um casamento de aparências, sem sentimentos. Como pude deixar isso acontecer comigo?” As palavras voltaram para mim tão afiadas que eu me encolhi por dentro, como se a dor da verdade estivesse tão nua e crua ali, que eu quase não poderia suportar. Fechei meus olhos por alguns míseros segundos, tentando em vão acalmar aquele turbilhão de emoções.
“Eu soube que ele queria entender.” Assenti para mim mesma, enquanto Margareth comentava sobre a falta de classe dos que não sabem o que significa um jantar com hora marcada. Eu não sorri, apenas encarei seu olhar, vendo que tipo de emoções passavam por ele.
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